31 Jan Reforma do IRC
Esta lei resulta do trabalho desenvolvido pela Comissão criada pelo governo em ordem à Reforma do Imposto sobre o Rendimento de Pessoas Colectivas que promovesse a simplificação deste imposto e a internacionalização e competitividade das empresas portuguesas.
Passamos a indicar, em síntese, as principais alterações ao Código do IRC aprovadas pela Lei n.º 2/2014:
1. Taxas de IRC e derrama estadual
a) A taxa geral de IRC foi reduzida de 25% para 23% já em 2014.
b) Aplicação de uma taxa de 17% aos primeiros € 15.000,00 de matéria colectável das entidades qualificadas como PMEs e desde que cumpridas as regras comunitárias de auxílios de minimis;
c) Aplicação de uma derrama estadual de 7% (e de um pagamento adicional por conta de 6,5%) ao lucro tributável superior a € 35 milhões.
A lei em causa prevê a possibilidade de uma redução da taxa de IRC para 21% em 2015, bem como a sua fixação num intervalo entre 17% e 19% em 2016, dependendo da análise e ponderação a efectuar por uma comissão de monitorização da reforma a constituir para o efeito, a qual se debruçará também sobre a possibilidade de reformulação dos regimes do IVA e do IRS, especialmente no que diz respeito à redução das taxas destes impostos.
2 – Regime aplicável às PMEs
2.1 – Regime simplificado:
Para além da supra referida taxa de 17% aplicável aos primeiros € 15.000 de matéria colectável, é criado um regime simplificado para empresas que preencham os seguintes requisitos:
a) Tenham obtido, no período de tributação imediatamente anterior, um montante anual ilíquido de rendimentos não superior a € 200.000,00;
b) O total do seu balanço relativo ao período de tributação imediatamente anterior não exceda € 500.000,00;
c) Não estejam legalmente obrigados à revisão legal de contas;
d) O respectivo capital social não seja detido em mais de 20%, directa ou indirectamente, por entidades que não preencham alguma das condições acima referidas, excepto quando sejam sociedades de capital de risco ou investidores de capital de risco;
e) Adoptem o regime de normalização contabilística para microentidades; e
f) Não tenham renunciado à aplicação do regime nos três anos anteriores, com referência à data em que se inicia a aplicação do regime.
A matéria colectável relevante para efeitos da aplicação do regime simplificado obtém-se através da aplicação de coeficientes sobre os rendimentos e ganhos obtidos, sendo que o valor determinado de acordo com esses coeficientes não pode ser inferior a 60% do valor anual da retribuição mensal mínima garantida.
2.2 – Dedução dos lucros reinvestidos:
A lei do OE 2014 veio permitir às PMEs deduzir à colecta do IRC, nos períodos de tributação que se iniciem em ou após 1 de Janeiro de 2014, até 10% dos lucros retidos que sejam reinvestidos em activos elegíveis, no prazo de dois anos contado a partir do final do período de tributação a que correspondam os lucros retidos.
Para efeitos desta dedução, o montante máximo dos lucros retidos e reinvestidos, em cada período de tributação, será de € 5.000.000, por sujeito passivo, sendo a dedução permitida até à concorrência de 25% da colecta do IRC.
Aplicando-se o RETGS, a dedução efectua-se ao montante apurado com base na matéria colectável do grupo até 25% deste valor, não podendo ultrapassar, em relação a cada sociedade e por cada período de tributação, o limite de 25% da colecta que seria apurada pela sociedade que realizou as despesas elegíveis, caso não se aplicasse este regime.
2.3 – Remuneração convencional do capital:
É permitida às PMEs a dedução de uma importância correspondente a 5% do montante das entradas realizadas, por entregas em dinheiro, pelos sócios, no âmbito da constituição de sociedade ou do aumento do capital social, desde que os sócios sejam exclusivamente pessoas singulares, sociedades de capital de risco ou investidores de capital de risco.
Esta remuneração tem como limite € 200.000 por entidade beneficiária, durante um período de três anos, não podendo ultrapassar os limites resultantes das regras comunitárias aplicáveis aos auxílios de minimis.
3 – “Participation exemption”
O regime de “participation exemption” contempla a isenção de IRC sobre dividendos e mais-valias relativamente a participações detidas por sociedades residentes em Portugal.
Para beneficiar deste regime, deverão verificar-se determinados requisitos, nomeadamente:
a) A sociedade que recebe os dividendos deverá deter, directa ou indirectamente, pelo menos 5% do capital social e direitos de voto da sociedade que distribui os lucros por um período ininterrupto de 24 meses;
b) A sociedade que distribui os dividendos não deverá ser residente num país, território ou região sujeito a um regime fiscal claramente mais favorável;
c) A sociedade que distribui os dividendos deverá estar sujeita a IRC, a um imposto referido no artigo 2.º da Directiva n.º 2011/96/UE, do Conselho, de 30 de Novembro ou um imposto de natureza idêntica ou similar ao IRC, cuja taxa legal aplicável não pode ser inferior a 60% da taxa do IRC.
Existem, no entanto, exclusões a este regime, designadamente quanto a certos tipos de dividendos e mais-valias resultantes da venda de sociedades que sejam proprietárias de bens imóveis situados em território português, em certas condições.
4 – Dedutibilidade de gastos
Foi eliminado o requisito da indispensabilidade, passando a ser dedutíveis os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC, os quais devem ser comprovados documentalmente.
5 – O novo regime de “patent box”
A lei em causa consagra um novo regime de “patent box”, que prevê a isenção de tributação de 50% dos rendimentos provenientes de contratos que tenham por objecto a cessão ou a utilização temporária de patentes e desenhos ou modelos industriais, verificadas as seguintes condições:
a) Os direitos de propriedade industrial tenham resultado de actividades de investigação e desenvolvimento realizadas ou contratadas pelo sujeito passivo;
b) O cessionário utilize os direitos de propriedade industrial na prossecução de uma actividade de natureza comercial, industrial ou agrícola.
6 – Reporte de prejuízos
Foi aumentado de 5 para 12 anos o prazo para dedução de prejuízos fiscais, sendo aplicável o novo prazo aos prejuízos gerados a partir de 1 de Janeiro de 2014.
Em contrapartida, o limite máximo de prejuízo fiscal dedutível em cada ano é reduzido de 75% para 70% do lucro tributável desse ano, sendo o limite aplicável a prejuízos fiscais gerados antes e após 1 de Janeiro de 2014.
O direito de deduzir os prejuízos deixa de estar condicionado à não alteração de actividade ou de objecto social da sociedade, não sendo afecto em caso de alteração da titularidade de mais de 50% do capital social ou da maioria dos direitos de voto nas seguintes situações, entre outras:
a) Adquirente detenha ininterruptamente, directa ou indirectamente, mais de 20% do capital social ou da maioria dos direitos de voto da sociedade desde o início do período de tributação a que respeitam os prejuízos;
b) Reestruturação empresarial (e.g. passagem da titularidade do capital social ou dos direitos de voto de directa para indirecta ou vice-versa e operações sujeitas ao regime especial de neutralidade fiscal);
c) Management buy-out; e
d) Sucessões por morte.
Nas restantes situações de alteração da titularidade de mais de 50% do capital social ou da maioria dos direitos de voto, o direito a deduzir os prejuízos depende de autorização do Governo. O requerimento deverá ser apresentado 30 dias após a transacção e já não antes da sua ocorrência.
7 – Regime especial de tributação de grupos de sociedades
O RETGS é flexibilizado com a redução da percentagem mínima de participação de 90% para 75%.
Por outro lado, para a determinação do nível de participação exigido passam a considerar-se as participações detidas indirectamente através de sociedades residentes em território português que reúnam os requisitos legalmente exigidos para fazer parte do grupo, mas também sociedades residentes noutro Estado membro da União Europeia ou no Espaço Económico Europeu, que sejam detidas, directa ou indirectamente, em, pelo menos, 75% pela sociedade dominante.
Em caso de fusão entre sociedades do grupo ou caso uma sociedade incorpore uma ou mais sociedades não pertencentes ao grupo, os prejuízos das sociedades fundidas verificados em períodos de tributação anteriores ao do início do regime podem ser deduzidos ao lucro tributável do grupo até ao limite do lucro tributável da nova sociedade ou da sociedade incorporante, desde que a essas operações seja aplicado o regime especial de neutralidade fiscal.
8 – Regime especial de neutralidade fiscal
O regime de neutralidade fiscal é alargado a outras operações de reestruturação empresarial, tais como:
a) Fusões inversas, nas quais a sociedade-mãe é fundida na sua filial;
b) Cisões inversas, nas quais a sociedade-mãe destaca um ou mais ramos da sua actividade, mantendo pelo menos um dos ramos de actividade, para os fundir com uma sua filial;
c) Fusões e cisões entre sociedades detidas pelo mesmo sócio.
9 – Tributação autónoma sobre veículos automóveis
Apesar da proposta do Governo contemplar um aumento da tributação autónoma sobre os gastos ou encargos com viaturas ligeiras de passageiros, motos ou motociclos, excluindo os veículos movidos exclusivamente a energia eléctrica, cujo custo de aquisição fosse igual ou superior a € 20.000, este aumento apenas se verificará para viaturas cujo custo de aquisição seja igual ou superior a € 25.000.
Assim, as taxas aplicáveis em 2014 serão as seguintes:
Custo de aquisição |
2013 |
2014 |
< € 25.000 |
10% |
10% |
>= € 25.000 < € 35.000 |
20% |
27,5% |
>= € 35.000 |
20% |
35% |
Mantém-se o agravamento em 10% quanto aos sujeitos passivos que apresentem prejuízo fiscal no período de tributação.
A tributação autónoma não será devida, nomeadamente, quando exista acordo escrito para a atribuição da viatura automóvel ao trabalhador, dado que neste caso a utilização pessoal da viatura pelo trabalhador ficará sujeita a IRS.
10 – Tratamento fiscal dos financiamentos intra-grupo
A dispensa de retenção na fonte nos rendimentos obtidos por SGPS ao abrigo de contratos de suprimentos é alargada a todos os sujeitos passivos residentes, bem como a outras formas de financiamento, incluindo papel comercial e obrigações.
Para beneficiar desta dispensa, deverão verificar-se as seguintes condições:
a) O sujeito passivo detenha uma participação na entidade devedora dos rendimentos de mais de 10%, directa ou indirectamente através de outras sociedades em que o sujeito passivo seja dominante; e
b) A participação tenha permanecido na sua titularidade, de modo ininterrupto, durante o ano anterior à data da sua colocação à disposição.
Paralelamente, ao abrigo da Lei do OE 2014, verifica-se um alargamento da isenção de imposto do selo aplicável às operações de tesouraria realizadas por SGPS, às operações realizadas por todos os sujeitos passivos residentes com sociedades participadas em, pelo menos, 10% (ou cujo valor de aquisição não seja inferior a € 5 milhões) ou que estejam em relação de domínio ou de grupo.
11 – Transparência fiscal
O regime de transparência fiscal passa a aplicar-se à sociedade cujos rendimentos provenham, em mais de 75%, do exercício conjunto ou isolado de actividades profissionais especificamente previstas no artigo 151.º do Código do IRS, desde que, cumulativamente, em qualquer dia do período de tributação:
a) O número de sócios não seja superior a cinco;
b) Nenhum sócio seja pessoa colectiva de direito público; e
c) Pelo menos 75% do capital social seja detido por profissionais que exerçam as referidas actividades, total ou parcialmente, através da sociedade.
Deste modo, para afastar a aplicação do regime de transparência fiscal em sociedades multidisciplinares, será necessário que a sociedade tenha mais do que cinco sócios e que mais de 25% do capital social seja detido por não profissionais.
Por último é de referir que a lei ora em análise aplica-se aos períodos de tributação que se iniciem, ou aos factos tributários que ocorram, em ou após 1 de Janeiro de 2014.